sexta-feira, 18 de agosto de 2006

Pro Beleléu

Detesto São Paulo.

Antes eu gostava quando eu era do Rio e eu vinha pra São Paulo ver show da Vanguarda Paulista e eu saía de noite e eu era muito jovem e eu estava aprendendo a tocar contrabaixo e eu era mineiro e eu tenho uns tios que são mineiros e moram em São Paulo há muito tempo e eles são músicos e eu queria ser músico que nem eles, os meus tios, e eu saía de noite com o meu tio que tinha uns amigos que eram da Vanguarda Paulista e tinha o Gigante que era amigo do meu tio e tocava com o Itamar Assumpção e eu fui no ensaio do Itamar Assumpção com o meu tio no dia que a Elis Regina morreu e de noite fazia um frio que eu achava gostoso e eu botava uns casacos que eram muito bonitos e elegantes que só dava pra eu usar quando eu vinha pra São Paulo e eu achava que São Paulo era igual Nova York e eu ia em vários bares e eu ia no Teatro Municipal ver o Macunaíma do Antunes Filho e eu ia no camarim do teatro porque o Antunes era amigo do meu pai e era de São Paulo e a mulher do meu tio era atriz do Macunaíma e eu ficava vendo as atrizes paulistas do Antunes que ficavam peladas andando pelo camarim achando normal ficarem peladas na minha frente e eu ficava maluco porque eu nunca tinha trepado e aquelas mulheres de São Paulo eram as mulheres que eu queria ter e eu batia muita punheta pensando nelas e eu queria muito vir morar em São Paulo porque no Rio não tinha Vanguarda Paulista, não tinha o grupo do Antunes, não tinha aquele frio gostoso de noite, não parecia com Nova York e as meninas do Rio eram gostosas de biquíni, todas bronzeadas, mas não tinham aquele lance de ficar com casacos elegantes de noite vendo shows de vanguarda e eu fui uma vez naquele lugar do Nelson Motta lá no Pão de Açúcar pra ver um show do Arrigo e os cariocas ficaram jogando latas de cerveja no palco e eu fiquei pensando que o Rio era uma província e ficou pior ainda quando aqueles grupos de rock começaram a aparecer e ninguém gostava mesmo da Vanguarda Paulista só eu e os paulistas aí eu fiquei sendo paulista de coração. Eu tinha um grupo de vanguarda no Rio de Janeiro e saiu uma matéria no Jornal do Brasil lançando a Vanguarda Carioca. Eu era da Vanguarda Carioca e eu tinha uma banda igual a banda do Arrigo e eu era o Arrigo e namorava a cantora da banda que tinha uma voz aguda e era igual a Tetê Espíndola e a gente sempre tocava no Circo Voador e eu achava que o Rio ia melhorar e ficar igual a São Paulo.

Eu adorava São Paulo.

Eu vim morar em São Paulo no ano de 1992 quando eu voltei da Alemanha e o Collor era presidente e todo mundo estava sem dinheiro e o Rio estava muito pobre e eu trabalhava com publicidade e as agências de publicidade do Rio estavam fechando porque o Rio é mais pobre do que São Paulo porque São Paulo é uma cidade que foi inventada só pro pessoal fazer uma grana e eu vim fazer uma grana em São Paulo e eu achava que São Paulo era a cidade mais parecida com Berlim que é a cidade que eu mais gosto e que é muito mais bacana que Nova York e muito melhor do que o Rio mas aí eu reparei que não era bem assim, que o Arrigo tinha sumido, não tinha mais Vanguarda Paulista, só tinha gente tentando ganhar dinheiro e eu não tinha mais banda e eu não era mais de vanguarda e eu trabalhava numa firma deprimente e as paulistas da firma e da Faria Lima não tinham deselegância discreta porra nenhuma e a poluição fazia meus olhos ficarem ardendo e todo mundo ficava só trabalhando e ganhando dinheiro e bebendo chops depois do trabalho e aqueles paulistas eram todos muito caretas com aqueles cortes de cabelo caretas que os chefes das firmas gostam, e aquelas mulheres caretas com aqueles conjuntinhos caretas de andar na Avenida Paulista na hora do almoço, indo para aqueles restaurantes de quilo caretas e eu sofria tanto com tanta saudade do Rio e dos meus amigos cariocas de vanguarda e de São Paulo quando São Paulo era de vanguarda e eu andava tanto de ônibus e ficava tanto tempo no trânsito com aqueles paulistas e eu morei numa rua que só tinha ferro velho e tinha uma favela sem charme atrás da casa do amigo onde eu morava e até a favela de São Paulo era careta e eu não via Nova York em lugar nenhum e dava vontade de chorar só de ver uma imagem do Pão de Açúcar na televisão e eu não conhecia ninguém em lugar nenhum e eu nunca mais vi um show do Itamar Assumpção e eu passei muitos anos assim sem nada de vanguarda, só firma, só restaurante de quilo, só Paulo Maluf que é uma das coisas mais paulistas que há e eu ficava com muita vontade de eu ir morar no Rio de novo e eu fui trabalhar no Rio e os meus amigos de vanguarda não eram mais de vanguarda e trabalhavam numas firmas e ganhavam muito mal e eu ganhava muito mais dinheiro em São Paulo do que no Rio e eu detesto dinheiro.

Adoro São Paulo.

Antes eu detestava quando eu achava que o Rio era muito melhor até que eu percebi que as coisas não são bem assim, quando eu percebi que eu sempre preferia outra cidade do que aquela cidade na qual eu estava morando antes e quando deu tudo errado naquele emprego que me levou de volta para o Rio e eu voltei de novo pra São Paulo pra fazer uma grana e eu comecei a reparar num monte de coisa boa que eu acho bom em São Paulo, que nem a Rua Augusta e a Avenida Paulista iluminada de noite no inverno e o fato de São Paulo ser uma das maiores cidades do mundo e ser um mundo tão grande e tão impossível de conhecer inteiro e o centro da cidade que é muito louco e o provincianismo muito grande, tão grande que chega a ser até moderno e os paulistas que são meio provincianos, mas de um provincianismo simpático na fila pra ver filme do Godard que ninguém gosta mais só eu e uns paulistas provincianos modernos e as músicas do Beleléu, que é o Itamar Assumpção falando de São Paulo à meia-noite e o sol alaranjado morrendo atrás dos prédios que nunca acabam no horizonte sem oceano e o zeppelin que fica passando na minha janela e o silêncio dos feriados e a noite alaranjada e as avenidas marginais alaranjadas na madrugada e a solidão que dói tanto e eu fico sentindo que há poesia em toda parte e o Itamar Assumpção morreu e São Paulo ficou tão sozinha à meia-noite e eu e São Paulo somos tão sozinhos e o universo é tão sozinho e a poesia é uma coisa dos sozinhos e eu em São Paulo gostando de sentir essa dor do Beleléu que morreu e da vanguarda que acabou e daquele tempo que eu adorava São Paulo, aquele tempo que eu detestava São Paulo. Foi tudo pro Beleléu aqui no meu coração em São Paulo.


de André Sant'Anna

quinta-feira, 17 de agosto de 2006

No rush

Feel it.
Timing is everything.
One who doesn't take no for an answer might get what what they want.

Passa

É estranho como é tudo perfeito. Nós e o mundo. Em nossas casas de vidro e nossos jardins de tulipas vermelhas.

Queria que o tempo parasse por alguns minutos só pra que eu guardasse essa imagem pra sempre.

Você e eu. Juntos. Um momento estranho e confortável que aquece nas noites frias.

E como tudo pode ser diferente enquanto tudo parece ser complicado.

Nossas mentes fugidias assoladas pelo medo do que queremos ser. Mas tudo acaba sendo uma falta.

Quando o coração de uma garota perdida na noite escura encontra um cigarro sendo aceso na esquina.


:: 21.6.06

Trecho fenomenal

As palavras a seguir já dizem todo o necessário.
Dizem que eu entendo.
Dizem o que quero.


(...) A escrita me saía espontânea, num ritmo que não era o meu, e foi na batata da perna de Teresa que escrevi as primeiras palavras na língua nativa. No princípio ela até gostou, ficou lisonjeada quando eu lhe disse que estava escrevendo um livro nela. Depois deu para ter ciúme, deu para me recusar seu corpo, disse que eu só a procurava a fim de escrever nela, e o livro já ia pelo sétimo capítulo quando ela me abandonou. Sem ela, perdi o fio do novelo, voltei ao prefácio, meu conhecimento da língua regrediu, pensei até em largar tudo e ir embora para Hamburgo. Passava os dias catatônico diante de uma folha de papel em branco, eu tinha me viciado em Teresa. Experimentei escrever alguma coisa em mim mesmo, mas não era tão bom, então fui a Copacabana procurar as putas. Pagava para escrever nelas, e talvez lhe pagasse além do devido, pois elas simulavam orgasmos que me roubavam toda a concentração. Toquei na casa de Teresa, estava casada, chorei, ela me deu a mão, permitiu que eu escrevesse umas breves palavras enquanto o marido não vinha. Passei a assediar as estudantes, que às vezes me deixavam escrever nas suas blusas, depois na dobra do braço, onde sentiam cócegas, depois na saia, nas coxas. E elas mostravam esses escritos às colegas, que muito os apreciavam, e subiam ao meu apartamento e me pediam que escrevesse o livro na cara delas, no pescoço, depois despiam a blusa e me ofereciam os seios, a barriga e as costas. E davam a ler meus escritos a novas colegas, que subiam ao meu apartamento e me imploravam para arrancar suas calcinhas, e o negro das minhas letras reluzia em suas nádegas rosadas. Moças entravam e saíam da minha vida, e meu livro se dispersava por aí, cada capítulo a voar para um lado. Foi quando apareceu aquela que se deitou em minha cama e me ensinou a escrever de trás para diante. Zelosa dos meus escritos, só ela os sabia ler, mirando-se no espelho, e de noite apagava o que de dia fora escrito, para que eu jamais cessasse de escrever meu livro nela. E engravidou de mim, e na sua barriga o livro foi ganhando novas formas, e foram dias e noites sem pausa, sem comer um sanduíche, trancado no quartinho da agência, até que eu cunhasse, no limite das forças, a frase final: e a mulher amada, cujo leite eu já sorvera, me fez beber da água com que havia lavado sua blusa.


:: Budapeste
autor: Chico Buarque de Hollanda
Editora Cia. das Letras
Ano: 2003

Trechos que encantam

Com o show do Chico cada vez mais perto, nada como dar uma aquecida nos motores por aqui com o lado literário do grande compositor.

Este trecho me é particularmente especial no momento.

(...) eu não buscava explicações, pretendia passear os olhos com calma naquele urbanismo. (...) Não me aborrecia caminhar assim num mapa, talvez porque sempre tive a vaga sensação de ser eu também o mapa de uma pessoa.


:: Budapeste
autor: Chico Buarque de Hollanda
Editora Cia. das Letras
Ano: 2003

Wizard of Oz

A heart is not judged by how much you love, but by how much you are loved by others.

De repente

Hoje tomei uma decisão.

Senti um alívio nas costas.


:: 25.7.06

Ano 2020

Por que eu te amo tanto?
Não sei, não sei.
O que te repele?
Só quero estar perto do fogo.
Como eu continuo sem você?
Em sintonia.
Mas isso às vezes dói.
Apenas respire.
- E continue.
Eu vivo largado no mundo.
Talvez você caia na minha rede um dia
Cheia de caco de vidro.


:: 25.7.06

quarta-feira, 16 de agosto de 2006

Fator preocupante

Estudo indica que aquecimento pode alterar 88% dos biomas florestais

Aumento na acidez dos oceanos preocupa cientistas - Foto: Divulgação/ Nasa
Aumento na acidez dos oceanos preocupa cientistas
Foto: Divulgação/ Nasa


"Buraco" na camada de ozônio sobre a Antártica
Foto: NASA

Temperatura dos oceanos - Foto: Nasa
Temperatura dos oceanos
Foto: Nasa

O aquecimento do planeta cresce em ritmo acelerado  - Foto: Divulgação/Science
O aquecimento do planeta cresce em ritmo acelerado
Foto: Divulgação/Science


Estudo feito no Reino Unido indica que aquecimento global médio superior a 3ºC anuais até 2100 poderá alterar 88% dos biomas florestais que ocupam mais de 5% da superfície da Terra.

Um novo estudo, feito por pesquisadores britânicos e cujos resultados serão publicado na próxima edição da revista Proceedings of the National Academy of Sciences (Pnas), reforça o que já se sabia: as grandes florestas do mundo, e principalmente a Amazônia, serão seriamente perturbadas se o aquecimento global não for contido.

Segundo a pesquisa, assinada por Marko Scholze, da Universidade de Bristol, no Reino Unido, e colaboradores, um cenário extremamente grave virá à tona se a temperatura global subir mais 3ºC por ano, em média, até 2100. Os pesquisadores trabalharam modelos de vegetação e de clima com base em três aumentos: até 2º C, de 2ºC a 3ºC e mais de 3ºC.

No pior cenário, 44% dos ecossistemas que hoje são sumidouros seriam transformados em fontes de carbono. Com mais carbono na atmosfera, as conseqüências do aquecimento global serão cada vez mais potencializadas.
Dessa forma, diz o estudo, o impacto sobre a Terra, se nada for feito, estaria garantido por pelo menos mais 200 anos. Até 88% dos biomas, que ocupam juntos mais de 5% da superfície terrestre, seriam afetados. Entre eles estaria a totalidade das florestas de altas latitudes do hemisfério Norte.

Ainda no intervalo de maior aumento da temperatura, a transformação global poderia ser ainda maior. No caso dos biomas que ocupam mais de 10% do planeta, 13% dessa área seria transformada. Está nessa lista boa parte das grandes florestas tropicais do mundo. Além da região amazônica, os ecossistemas asiáticos também seriam diminuídos.

O artigo A climate-change risk analysis for world ecosystems poderá ser lido por assinantes, depois de publicado, no endereço www.pnas.org.

Redação 360
Fapesp

As máximas da FLIP

Interrompemos o fluxo das sentimentações agendadas, para que brote a visita de um afeto… Escrever é um combate para encontrar lugar no acolhimento. O acolhimento acontece quando o abismo recebe cidadania… Eu habito sempre entre o abismo e o clamor.

(Juliano Garcia Pessanha, autor de "Ignorância do sempre", na mesa que abriu a Flip, quinta-feira.)

Nó, mas o ser humano é miserável demais, gente!

(Adélia Prado, hoje de manhã, traduzindo sua descrença na espécie.)

Eu não quero ter razão, eu quero ser feliz.

(Ferreira Gullar, ontem, irritando seu companheiro de mesa Mourid Barghouti.)

O que eu posso dizer para você? Existe uma coisa chamada ironia.

(Tariq Ali, em sua palestra de sexta-feira, quando alguém da platéia o acusou de ser homofóbico e anti-semita por ter citado um trecho de Proust em que o sionismo é criticado à luz da história de Sodoma e Gomorra.)

Aplaudam, seus f.d.p.! É Lilian Ross que está ali!

(Christopher Hitchens, aos berros na primeira fila da platéia da jornalista da "New Yorker", exigindo que o público a reverenciasse no exato momento em que ela entrava no palco.)

O cloridrato de fluoxetina me fez uma pessoa equilibrada e agradável.

(Lourenço Mutarelli, na mesa que dividiu sábado com Reinaldo Moraes e André Sant'Anna.)

Não penso em meus personagens como pessoas reais. Perguntar se eu sinto saudade deles depois de terminar um livro é como perguntar se eu vou sentir saudade desse microfone quando a palestra terminar.

(Jonathan Safran Foer, na mesa que dividiu com Ali Smith.)

Fonte: Sérgio Rodrigues no blog Todoprosa do NoMínimo

terça-feira, 15 de agosto de 2006

Voltei da FLIP e o lema do dia é...





Truth is beauty,
Beauty Truth,
That is all ye know on earth,
And all you need to know.

:: Obrigada John Keats por ter existido e mudado para sempre a visão da poesia na minha vida. :)

Fotos de Paraty no dia 10 de agosto de 2006. Todas no Centro Histórico. As duas últimas ao lado do cais.

Paraty me deixou absolutamente abismada ao descobrir que há muito mais poetas no Brasil do que sequer imaginamos. Todo tipo de poema era declamado pelos quatro cantos da cidade. Poetas distribuíam, vendiam, mostravam seus trabalhos para os passantes desavisados e os interessados.

Brasil, país da poesia? Quem diria... ;)

terça-feira, 8 de agosto de 2006

Ausência temporária

Provavelmente não vou postar nada até segunda-feira, que é quando estarei de volta de 'férias' para a labuta.

Enquanto isso, posso ser encontrada aqui:

Listas

Como boa leitora de Nick Hornby, ADORO listas.

Descobri as mais novas do cinema e queria dividir isso com quem passar por aqui.

Tem as listas das 50 melhores comédias e os 50 melhores finais de filmes de todos os tempos.

Pode olhar e comentar aqui. ;)

P.S. tudo em inglês...